Maria Bonomi

Maria Anna Olga Luiza Bonomi (Meina, Itália 1935).
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Gravadora, escultora, pintora, muralista, curadora, figurinista, cenógrafa, professora. Maria Bonomi vem para o Brasil em 1946, fixando-se em São Paulo. Estuda pintura e desenho com Yolanda Mohalyi (1909-1978), em 1951, e com Karl Plattner (1919-1989), em 1953. No ano seguinte, inicia-se em gravura com Lívio Abramo (1903-1992). Realiza a sua primeira individual em São Paulo, em 1956. Nesse ano, recebe bolsa de estudos da Ingram-Merrill Foundation e estuda no Pratt Institute Graphics Center, em Nova York, com o pintor Seong Moy (1921). Em paralelo, cursa gravura com Hans Müller e teoria da arte com Meyer Schapiro (1904-1996), na Columbia University, também em Nova York. De volta ao Brasil, freqüenta a Oficina de Gravura em Metal com Johnny Friedlaender (1912-1992), no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – MAM/RJ, em 1959. No ano seguinte, em São Paulo, funda o Estúdio Gravura, com Lívio Abramo, de quem é assistente até 1964. A partir dos anos 1970, passa a dedicar-se também à escultura. Produz painéis de grandes proporções para espaços públicos. Em 1999, defende a tese de doutorado intitulada Arte Pública. Sistema Expressivo/Anterioridade, na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo – ECA/USP.
 
COMENTÁRIO CRÍTICO
 
Para Maria Bonomi, o trabalho com a xilogravura é uma experiência que oferece ilimitadas possibilidades de criação artística. Ao expor na 5ª Bienal de Paris, em 1967, na qual recebe o primeiro prêmio, luta para que as gravuras sejam expostas em paredes, e não em balcões ou vitrines, como páginas de livros, o que era usual na época. Assim, modifica-se a relação do público com a gravura, e também do artista no exercício de gravar.
O gravador lida sempre com questões relacionadas à matriz e à imagem impressa: ao trabalhar madeira ou metal, o registro é diferente daquele obtido no papel. Nas matrizes estão as marcas da relação do artista com a matéria, do impulso e dos gestos que criam a obra. Para a gravadora Renina Katz (1926), Maria Bonomi revela em seus trabalhos alguns desses jogos fascinantes do universo da gravura. Em 1972, apresenta as Solombras, transparentes e coloridas, moldadas em poliéster com base em matrizes de madeira. Já em 1976, realiza os Epigramas, obras fundidas em metal com base em peças de barro, em que produz linhas e sulcos, explorando cheios e vazios e revelando a essência do gesto do gravador.
A artista insiste, ao longo de sua carreira, nas grandes tiragens, que permitem o acesso às obras pelo maior número de pessoas; para tanto utiliza também a litografia. Inova ao produzir em grandes formatos (alguns trabalhos com mais de dois metros de largura), demonstrando o desejo de conferir maior vigor e impacto estético às gravuras. Outro ponto importante em sua obra é a utilização da cor em tonalidades variadas e inesperadas.
Além de gravuras a artista continua produzindo relevos em concreto ou metal, dispostos em vários espaços públicos de São Paulo como na Igreja Mãe do Salvador, no Palácio dos Bandeirantes e na estação de metrô Jardim São Paulo. Nesses murais, Maria Bonomi parte da experiência como gravadora, explorando o grafismo resultante dos sulcos da gravura em madeira. As texturas e a gestualidade, são transferidas para o concreto ou metal. Problematizando o mito da peça única, a artista também desenvolve projetos na área de vestuário (camisetas, gravatas, echarpes).
Maria Bonomi é presença importante no cenário da gravura brasileira. Nas palavras de Lívio Abramo: “Vitalidade, veemência, paixão, ousadia formal são as características da obra gráfica desta artista que soube transmitir às suas gravuras a paixão de seus sentimentos e a densa expressividade da síntese formal”.1
 
NOTAS
 
1 Livio Abramo, texto do catálogo Maria Bonomi Xilograbados Litografia, Centro de Estudos Brasileiros (Asunción, Paraguay), citado em BONOMI, Maria. Xilografias de Maria Bonomi. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1994.
 
EXPOSIÇÕES
 
• 1951 Auxilia na montagem da I Bienal de São Paulo.
• 1952 Estuda desenho e pintura com Yolanda Mohalyi por sugestão de Lasar Segall.
• 1953 Aprimora-se com Karl Plattner.
• 1955 Mais jovem artista na III Bienal de São Paulo. Com Livio Abramo, inicia-se nas incisões xilográficas.
• 1956 Primeira exposição individual no MAM-SP. Recebe o Prêmio Leirner em ex-aequo com Lygia Pape.
• 1957 Na Europa, estabelece relação artística com Emilio Vedova, pintor que conhece desde 1953.
• 1958 Nos Estados Unidos, estuda nas Universidades de New York e de Columbia. Recebe bolsa da Ingram-Merrill Foundation para estudar no Pratt Institute com o mestre Seong Moy. Ainda em Nova Iorque, realiza primeira individual, recebe elogiosas críticas em jornais e a ilustre visita de Salvador Dali.
• 1959 De volta ao Brasil, trabalha na oficina de gravura em metal de Johnny Friedlaender, instalada no MAM-RJ. Recebe seu primeiro prêmio aquisição da
V Bienal de São Paulo.
• 1960-64 cria o Estúdio Gravura com Livio Abramo e desenvolve projetos editoriais, entre os quais o Álbum Brasil, coligido por Sérgio Buarque de Hollanda, com gravuras de Livio Abramo, João Luís Chaves e Maria Bonomi.
• 1960 No teatro, concebe cenários e figurinos de Fim de Jogo, Hoje Comemos Rosas e As Feiticeiras de Salem; pela qual recebe prêmio da APCA.
• 1961-73 Participação ininterrupta das International Biennial of Graphic Art em Ljubljana.
• 1965 Melhor Gravador da VIII Bienal de São Paulo e, em 1967, Prêmio Theodoron Foundation da V Bienal de Paris. Nesse período, sua gravura é destaque pela monumentalidade.
• 1965 Por cenários e figurinos, recebe os prêmios Saci, Molière, e em 1968, Governador do Estado.
• 1969 Em protesto contra a ditadura militar, recusa sala individual na Bienal de São Paulo e, em 1974, é presa por subversão.
• 1971 Clarice Lispector escreve artigo para jornal sobre a riqueza da matriz xilográfica de Maria Bonomi.
• 1972 Maria Bonomi reproduz matrizes de suas gravuras em poliéster como múltiplos tridimensionais. As expõe em Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro.
• 1973 Produz e expõe, na XII Bienal de São Paulo, o filme Detritos com o apoio técnico de Thomaz Farkas.
• 1974 Em São Paulo, concebe o altar da igreja Mãe do Salvador, seu primeiro projeto de Arte Pública. Seguem-se a esse projeto, os painéis do edifício Jorge Rizkallah Jorge (1976) e Esporte Clube Sírio (1977).
• 1976/77 Membro dos Conselhos de Arte e Cultura da Bienal de São Paulo e, em 1978, da I Bienal Latino Americana de São Paulo.
• 1979 Coordena a representação brasileira na I Trienal Latino Americana del Grabado em Buenos Aires. Executa os painéis Arrozal de Benguet: Paisagem e Memória (Hotel Maksoud Plaza, São Paulo), nos quais reproduz no concreto os sulcos da matriz em madeira. Por eles, recebe o Grande Prêmio da Crítica, concedido pela APCA.
• 1981 Entalha o barro para fazer relevos em metal chamados de Epigramas.
• 1982 Em São Paulo, executa seu primeiro painel residencial em concreto: Parede Despetalada, no ano seguinte, realiza outro painel em Manaus.
• 1983 Na International Biennial of Graphic Art, em Ljubljana, recebe prêmio do Júri Internacional, e expõe como sala especial em 1985.
• 1984 Em Santiago do Chile, mescla concreto e metal no painel do Banco Exterior de Espanha.
• 1985 Realiza Cordilheira Vegetal, painel residencial em concreto, em São Paulo.
• 1987 Produz painel Dois Hemisférios, em concreto policelular, para o Banco Sudameris em São Paulo.
• 1989 Ergue no Memorial da América Latina o painel Futura Memória em solo-cimento com inscrições míticas da América Latina. Curadora da Sala Especial Octavio Pereira, na XX Bienal de São Paulo.
• 1990 Executa painel em concreto, Eroscopia, para a residência do arquiteto Haron Cohen. É eleita presidente da Comissão Técnica de Arte da XXI Bienal de São Paulo e demitida, no ano seguinte, após denunciar irregularidades na administração.
• 1992 Elabora a obra Anjo, em pedra e bronze, para a Praça Cecília Périgo Saldiva em São Paulo.
• 1995/1997/1999 Três curadorias da representação brasileira nas 21ª, 22ª e 23ª International Biennial of Graphic Art, em Ljubljana, obtendo nessa última o prêmio de melhor curadoria.
• 1997 Em parceria com o Governo do Estado de São Paulo, inaugura escultura Páginas para o Jardim do Arquivo do Estado.
• 1998 Na estação de metrô Jardim São Paulo, realiza obra em concreto, Construção de São Paulo, que celebra a cidade. Funde em latão e alumínio os painéis Imigração e Substituição para o Palácio dos Bandeirantes. Na III Bienal Barro de América em Maracaibo, na Venezuela, trabalha a instalação Sete Horizontes do Homem, obra também montada no Memorial da América Latina. Ainda em 1998, é curadora da representação brasileira e membro do Júri Internacional na 2nd. International Triennial of Graphic Art, em Praga.
• 1999 Convidada especial e co-organizadora da Mostra Rio Gravura, realizada no Rio de Janeiro. Doutora-se na ECA-USP com a tese Arte Pública = Sistema Expressivo / Anterioridade.
• 2000 Entrega painel Nemeton, em concreto aditivado, para o Edifício Faria Lima Premium (São Paulo). Recebe da ABCA o Prêmio Mario Pedrosa 1999. Realiza curadoria das representações brasileiras na XII Bienal Iberoamericana de Arte (Cidade do México) e na I Bienal Argentina de Gráfica Latinoamericano (Buenos Aires).
• 2001 Realiza a instalação Passagem pela Imagem III na IV Bienal Barro de América (Venezuela e Brasil) e, na 3rd International Triennial of Graphic Art de Praga, por Sete Horizontes do Homem, recebe o Prêmio Honorário do Júri Internacional.
• 2002 Executa a escultura Ginete Serasa, para a sede do Serasa em São Paulo. Inaugura também painel residencial em concreto com vários níveis e água corrente.
• 2003 Cria o painel residencial As Letícias, integrando alumínio e espelhos.
• 2004 Jan. Participa da exposição Uma viagem de 450 anos, com curadoria de Radha Abramo, em comemoração ao aniversário da cidade de São Paulo. Em Maracaibo, participa da V Bienal Barro de América com a Instalação Pele Humana, Pele Urbana. Em fins de 2004, inaugura painel em concreto para a Estação da Luz, Epopéia Paulista, que narra a história das imigrações à cidade de São Paulo. A partir do painel, Maria Bonomi realiza Infecção da Memória, obra levada para as cidades de Buenos Aires, Praga, Amsterdã, Berlim, Milão e Viena. Profere palestra e recebe sala especial na I Bienal Internacional Ceará de Gravura, e em 2005 é convidada, pela Prefeitura da cidade, a dirigir e participar do projeto Fortaleza Bela.
• 2005 A convite da Secretaria de Estado da Cultura, como parte do projeto de revitalização do centro da cidade de São Paulo, inaugura a curadoria do Atelier Amarelo. Em maio, Infecção da Memória é levada ao Centro Cultural BM&F. Encerra 2005 com a participação na 2nd Beijing International Art Biennale, na China.
• 2006 Reproduz em alumínio o painel Eroscopia para nova residência de Haron Cohen. Realiza a escultura Floresta Navegante, em concreto armado, para o Parque José Ermírio de Moraes Filho, em Curitiba. Ainda em 2006, cria os relevos Love Layers, obras que possibilitam a suspensão em tetos como móbiles sonoros ou em outros ambientes em que eles se integrarão.
• 2007 Ago. Participa da Décima Exposição do Centro de Pesquisa em Gravura da Unicamp com gravura-instalação The Man at First. Nov. Em parceria com o jovem artista venezuelano Carlos Pedreañez cria e expõe gravura digital na 14ª. Trienal Gráfica de Tallinn, na Estônia. No Museu Oscar Niemeyer de Curitiba, destaca-se em sala especial com gravuras consagradas e com obras tridimensionais muito significativas quanto à renovação artística contemporânea e os percursos da artista voltados para a arte nas cidades.
• 2006-2008 Sob reconhecimento de Oscar Niemeyer, Maria Bonomi desenvolve o painel em cerâmica, bronze e alumínio Etnias: do Primeiro e Sempre Brasil, para o Memorial da América Latina. A iconografia dessa obra de Arte Pública narra a história dos índios brasileiros.
• 2007-2008 Mostra individual De Viés no Museu Oscar Niemeyer em Curitiba com gravuras, instalações e “Layers” que mostram o percurso artístico de Maria Bonomi desde a década de 70.
• 2008 Publicação do livro com a retrospecção da obra da artista nominado “Maria Bonomi – Da gravura à arte pública” organizado pela pesquisadora Mayra Laudanna e lançado pela Edusp e Impresa Oficial.
• 2008 Mar-Abr. Participa da mostra e projeto Arte pela Amazônia cuja temática trouxe obras afinadas com questões sócio-ambientais.
• 2008 Mar – Maio. Integra a exposição Arte 83: Peso e Volume, Escultura Paulista Hoje que reúne 21 escultores consagrados com 70 obras expostas no Museu de Arte Contemporânea de Campinas José Pancetti.
• 2008 Abr. – Maio Expõe, em parceria com Carlos Pedreañez, a gravura-instalação The Man at First, na Quarta International Collage Exhibition Vilnius 2008, na Lituânia.
• 2008 Maio – Jun. Realiza mostra “Jouissance Graphique” na Embaixada Brasileira de Bruxelas e recebe o aval da crítica e diretora do Centre de la Gravure et de l’Image imprimée, Catherine de Braekeleer, de que suas matrizes, seus ritmos “ressoam em um júbilo gráfico e esse encontro lírico se desdobra em uma dimensão cívica e humanista que encontra seu ápice no seio de suas numerosas criações de arte pública”.
• 2008 Maio – Jun. Integra a atividade Processos Criativos na Arte Contemporânea com palestra e work-shop no evento Redes de Criação promovido pelo Núcleo de Educação Cultural do Itaú Cultural.
 
CRÍTICA
 
que irá surgir depois da impressão, pois não se encontra de imediato na matriz trabalhada. A gravura suporta o mal traço que improvisa, o lirismo da linha espontânea. È preciso controlar o gesto que marca e não pode ser apagado.
Mas o gravador se vê obrigado a conjugar essa exigência mental com a prática, manual e complexa, do artesão. As matrizes impõem a resistência de suas matérias, que a mão deve conhecer, negociando com suas oposições, intuindo suas docilidades.
Quem conta a historinha de Hans Müller sobre as faculdades reflexivas da gravura é Maria Bonomi, que era então a jovem aluna.
Está num livro de tamanho bom, nem grande de mais como certos mastodontes difíceis de guardar, nem tão pequeno que prejudique as reproduções. È bonito, com sóbria diagramação e alta qualidade das imagens. Reúne documentação sobre uma história que é, ao mesmo tempo, individual e coletiva. Seu título: “Maria Bonomi – Da Gravura à Arte Pública” (Edusp/Imprensa Oficial do Estado de SP, organizado por Mayra Laudanna, com participação de Leon Kossovitch).
 
Goiva

“Maria Bonomi – Da Gravura à Arte Pública” não presta uma homenagem à grande artista. Faz muito mais que isso. Traz ensaios seus que abarcam a questão da arte pública. São interrogações complexas: os vínculos entre a obra e a cidade, a adequação das formas e dos materiais, as inflexões culturais coletivas e específicas. Tudo tratado com grau elevado de pensamento, apoiado em cultura ampla, vivida.
Traz também depoimentos, em linguagem tão bonita e tão justa. Assim por exemplo: “Sempre gostei de cortes retos, sem bruma”. Maria Bonomi fala de sua parte e conta de sua trajetória artística.
Formou-se, desde criança, junto ao “nonno” entalhador, que havia freqüentado uma escola de artes e ofícios em Lucca, na Itália e trabalhava aqui no Brasil. Depois, sua arte desabrochou em contato com personalidades formidáveis da cultura brasileira e internacional, lista impressionante, que surge em sua narração com naturalidade e sem sombra de esnobismo.
O livro reproduziu muitos documentos em excelente fac-símile. Eles trazem o aspecto material do papel, dos manuscritos, dos artigos recortados e amarelecidos, permitindo chegar mais perto do universo artístico ao qual Maria Bonomi pertence e do qual é uma estrela maior.
 
Formão

“A gravura nunca é frívola, porque ela é basicamente irreversível.” “A gravura é essencialmente uma incisão.” A primeira frase é de Renina Katz; a segunda, de Evandro Carlos Jardim. Elas inspiram a Maria Bonomi um trecho de referência sobre a arte do gravador.
Buril
 
“A Arte tem que alcançar o maior número possível de pessoas” Essa frase simples de Maria Bonomi une suas duas atividades mais importantes: a gravura, que é um múltiplo, e a arte pública, que se destina a todos.
 
Jorge Coli – Colunista da Folha
Maio de 2008
 

www.mariabonomi.com.br