Mario Gruber - em memória

Mario Gruber Correia foi um pintor, gravador, escultor e muralista brasileiro. Autodidata em pintura que se transformou em mestre na interpretação do traço, da cor e do humanismo.
 Mario Gruber faz da gravura, por sua possibilidade replicante, a mensageira de seu olhar sobre a arte, ao propor uma nova ordem no fazer e no pensar, ao utilizar-se de aparente figuração para fundir a modernidade à contemporaneidade.
  rovoca um dialogo constante entre gerações: tempo e espaço, vanguarda e não vanguarda, arte do passado e do presente. Nega estilos e técnicas, nega a divisão entre abstrato ou figurativo.Mario Gruber - Biografia
 Mario Gruber nasceu em Santos em 1927 e começou a pintar em 1943, como autodidata, apresentando uma produção ligada ao expressionismo. Tornou-se profissional aos 20 anos de idade, quando participou da Exposição Grupo dos 19 e o júri, formado por Lasar Segall, Anita Malfatti e Di Cavalcanti, conferiu-lhe o primeiro prêmio em pintura.
 Em 1949, recebe uma bolsa do governo francês, e viaja para Paris, onde se dedica ao estudo de pintura e gravura em metal. Retorna ao Brasil em 1951, quando funda, em Santos, o Clube de Gravura, mais tarde Clube de Arte, marcando o início de sua participação na vida artística e cultural brasileira. Em 1953, convocado por Gabriela Mistral, Diego Rivera e Pablo Neruda, participa como delegado no I Congresso Continental de Cultura, no Chile.
 A partir dessa data os prêmios e as exposições nacionais e internacionais se acumulam e sua obra motiva a realização de dois curta-metragens, um deles exibido no Festival de Cinema de Veneza, em 1967, direção de Rubens Biáfora, ganhador do Prêmio Governador do Estado; o segundo – “A Arte Fantástica de Mario Gruber”, dirigido por Nelson Pereira dos Santos -, 1982.
Gruber tem telas em vários museus brasileiros e internacionais, como o Wisconsin State Museum College Union, USA; Museu Poushkin, Moscou, URSS; Museu de Arte Contemporânea, São Paulo, SP; Museu de Arte Brasileira, São Paulo, SP; Museu de Bahia, Salvador, BA e outros.
 Em sua obra gráfica dessa época, aproxima-se do realismo social praticado por outros artistas ligados aos clubes de gravura. A cidade, suas ruas e casas são temas para sua produção gráfica.
 Mario Gruber realiza também pinturas de caráter figurativo, partindo de imagens cotidianas, como a vida nas metrópoles, para envolvê-las em jogos de imaginação. O artista cria personagens fantásticos.
 A partir da década de 1970, passa a empregar recursos do processo fotográfico, como a ampliação, para criar novos tipos de imagens. Pesquisa também as linguagens da televisão e do cinema. Mantém um constante diálogo com a tradição da história da arte, como na exposição de 1985, na qual recria telas do pintor italiano Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571-1610) e do francês Georges de La Tour (1593-1652), realizando ampliações a partir dos quadros desses artistas e apreendendo a dramaticidade e a dinâmica da luz presentes em suas obras.
 A luminosidade apurada, a gama cromática muito controlada e a pincelada livre estão presentes em quadros posteriores, como Balão Verde e Preto (1996). Criando personagens que são freqüentemente mascarados, magos, anjos e robôs, Mario Gruber produz obras que causam estranheza e relacionam-se a uma temática ligada ao realismo fantástico.
 Sua participação em obras de arquitetura, a convite de seus autores, vem de longa data. Além de colabora com Oscar Niemeyer, para o arquiteto Vilanova Artigas, por exemplo, fez os painéis da “Casa dos Triângulos” na Galeria Califórnia. Marcou também sua posição de vanguarda no realismo fantástico brasileiro ao criar os grandes painéis do Aeroporto internacional de Cumbica e da Estação Sé do Metrô de São Paulo.
 Depoimentos
 “Fui um dos primeiros gravadores em metal de São Paulo. Hoje, arrumando meu ateliê, revejo as primeiras placas, de 1946-1947, e todo o trabalho posterior. A gravura é uma paixão constante e que vai continuar. Um fato praticamente inédito é que sou possuidor de toda a minha gravura. (…)
É uma bomba para o mercado, pois o artista que é dono de sua obra pode colocá-la com critério. Não significa que eu vá vender por uma fortuna. (…)
Fiz poucas gravuras em cor. Eu me disciplinei para só realizar gravuras em cores quando tivesse condições adequadas. Como gravo em metal – cobre – e aqui não há o banho de aço, o cobre funciona como abrasivo. Um amarelo, por exemplo, sempre ficará esverdeado. Por respeito ao meu trabalho, deixo de utilizar a cor, pois é muito besta fazer uma obra que vai sumir depois, ou que seja uma expressão diferente da que a concebi. Mas também há outra razão: eu acho, particularmente, que gravura é preto-e-branco, como vi na Casa de Rembrandt, em originais gravados por ele, efeitos incríveis, quase inexplicáveis. (…)
Numa exposição que fiz, em 1967, reuni trabalhos de um ano, que me levaram a pensar nos meus caminhos. São três formas próximas da esfera: o ovo, o planeta, a nave. O primeiro é o universo da germinação, do nosso passado ancestral, um conteúdo interno que eu situo como meu interesse para saber a história de uma pessoa quando lhe faço o retrato. O planeta é o nível de uma velha predileção minha, o realismo. Muitas penas eu sofri por isso, na época da abstração, pois só com a pop art que a imagem voltou a ser consagrada. (…)
hoje, preocupa-me a linguagem do impresso e do museu, a comunicação de massa, a linguagem de mídia. (…) Tem boa técnica o artista que se exprime bem. Eu procuro, na arte, uma linguagem de mídia, o que fascina, sem explicação”.
Mario Gruber (22 de dezembro de 1975)
 “Para mim, a gravura em metal em preto-e-branco é música de câmara, enquanto a pintura tem o som da orquestra sinfônica. A aproximação à gravura é sempre mais difícil, exige atenção, acuidade, e um certo olho para o detalhe. Mas quem consegue se aproximar percebe logo que não se trata de técnica menor; ao contrário, como toda forma camerística ela é densa, funda, e possui luz própria. Uma luz que, no meu caso, serve também como referência para a pintura. Ela funciona, digamos, como ‘juízo crítico’ dos quadros que pinto. Porque a gravura tem, concisamente, tudo o que a arte plástica deve ter: desenho, movimento, expressão e intensidade. (…) Ao contrário da pintura, a gravura não pode ser apreendida apenas por seu lado exterior e alegórico. Ela atua no fio da navalha, na exata intersecção entre a essência e a forma. Além de ser um espelho mágico, já que é única e muitas ao mesmo tempo. Por isso requer uma compreensão mais difícil, elaborada, e aí pode estar, também, uma das causas do preconceito. Mas a gravura resiste. Não é a primeira vez que ela é preterida pelo gosto corrente e pela moda”.